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quinta-feira, janeiro 24
terça-feira, janeiro 22
PERDA
Seu Getúlio
empurrou o prato em silêncio e foi sentar-se também no mesmo silêncio no
surrado sofá em frente à televisão. Procurou uma partida de futebol qualquer, e
não achando ficou assistindo – ou quase... apenas olhava para a frente em
direção ao vídeo sem ver nada – o final do capitulo de alguma novela. D. Esther
recolheu os dois pratos sujos com os restos do jantar e o da filha que estava
limpo como sempre estava desde o dia em que eles a perderam.
Depositou os
sujos no fundo da cuba da pia e guardou o limpo como de costume. D. Esther
sabia que o terceiro prato nunca mais seria usado, mas mesmo assim sempre o
colocava na mesa, como fazia antes de perder sua filha.
Lavou os dois pratos
pensando como seria bom se tivesse três para lavar! O trabalho seria maior, mas
ao menos a filha ainda estaria entre eles! Assim que terminou com o segundo,
ficou estática a olhar para os pequenos pingos de água que escorriam do prato e
fugiam em direção ao ralo e, junto com os pingos de água fugiam também os
pingos de lágrimas de seus cansados e sofridos olhos, assim como a filha fugira
de suas vidas!
Mesmo o
terceiro prato estando limpo, ela o pegou de dentro do armário e colocou
embaixo da água que escorria da torneira e o lavou como se preciso fosse. Não
era necessário, mas pouco importava, pois ao lavar o terceiro prato há muito
não usado, dava-lhe a sensação de que ele também havia sido usado. Enganava-se
conscientemente.
Seu Getúlio
desviou os olhos que nada viam para ver a atitude que a pobre esposa toda noite
fazia. Pensou em mandar ela para de fazer aquilo, mas não o fez! Voltou os seus
olhos para continuar a não ver o que antes não estava vendo! Esperava que um
dia a esposa fosse se conformar e parar de fingir que não havia perdido – assim
como ele - a filha.
Após secar os
pratos e os olhos, também sentou-se ao lado do marido em frente a TV e ficou
também perdida sem nada ver. Para eles só havia um imenso vácuo que não
permitia a eles verem nada, a não ser a falta de sua filha.
Ficariam assim
os dois vendo o nada até o momento em que se retirariam para o quarto para
dormirem junto com seus pesadelos, não fosse o zumbido da campainha que os
acordou daquele sonho acordado.
A campainha
feriu não só os ouvidos, mas também o coração de D. Esther! Seu Getúlio baixou
o som da TV e dirigiu-se lentamente para a porta, como um gado que vai para o
matadouro.
Seu Getúlio
abriu a porta já sabendo quem veria! Na varanda, bem abaixo do velho lustre que
ele havia instalado anos antes, estava Cleumar com seu gorro preto de sempre e
uma jaqueta de couro surrada e totalmente aberta, que deixava aparecer na linha
da cintura uma pistola calibre 6.5mm.
_ A Solânge? –
falou Cleumar como se não houvesse ninguém a sua frente -. Cleumar estava
foragido e desde então comandava o tráfico de drogas no bairro onde eles
moravam.
_ Solânge!...
– Gritou o pai virando de costas e deixando a porta aberta. Foi sentar para
novamente continuar a não ver o que passava na TV. Solânge surgiu correndo
dentro de uma mini-saia que mal lhe cabia e jogou-se ao pescoço de Cleumar.
Beijou melosamente os grossos lábios dele e já ia fechando a porta quando D.
Esther falou com uma voz débil:
_ Solânge... Leva
um casaquinho minha filha! Tá frio!
_ Não encha o
saco mãe! – respondeu ao fechar bruscamente a porta.
Seu Getúlio
desligou a TV e foi dormir, D. Esther ainda ficou alguns minutos chorando em
frente à TV desligada...Ela não conseguia se acostumar com a ideia de que havia
perdido Solânge, sua única filha!
sexta-feira, janeiro 11
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